terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Defender nuclear em Portugal é uma uphill battle

Defender a energia nuclear em Portugal é aquilo a que os ingleses designam de uphill battle. A maioria dos portugueses tem um medo inexplicável e não justificado em relação à energia nuclear. Vou admitir que seja a maioria pois começo a achar que existe uma grande minoria silenciosa que não é anti-nuclear. Atribuo esse medo ao desconhecimento. Mas a questão é que mesmo pessoas aparentemente informadas sobre o sector energético são incapazes de serem objectivos quando se fala de energia nuclear. Se os especialistas não são capazes de ser objectivos como se pode esperar que a maioria da população seja?
Um bom exemplo foi dado no programa Olhos nos Olhos 18 da passada terça-feira 31 de Janeiro. Ainda que não seja um especialista em energia nuclear Agostinho Pereira de Miranda é um advogado que há muitos anos trabalha com empresas no sector petrolífero. Prova do seu conhecimento do sector é dado no video acima quando, revelando dados interessantes sobre as reservas e o custo de exploração de tar sands no Canadá, desmonta a ideia do peak oil.

Mesmo não sendo um especialista em energia nuclear Agostinho Miranda não se furtou a comentar sobre ela. Ironicamente é precisamente com um argumento de peak uranium que Agostinho Miranda afasta a viabilidade desta forma de energia para solucionar o fornecimento de energia eléctrica numa escala mundial. E se Agostinho Miranda vê como desactualizada a teoria do peak oil qualquer pessoa minimamente entendida em energia nuclear sabe que Agostinho Miranda está redondamente enganado em relação ao nuclear. Os equívocos começam no minuto 7:00 deste segundo filme:
Primeiro argumento: Impacte ambiental. Começa por mencionar o custo ambiental do ciclo de vida de uma central nuclear. O custo ambiental de uma central nuclear tem de ser vista em relação à energia que ela produz. Como esta produz quantidades enormes de energia eléctrica a partir de pequenas quantidades de urânio a pegada ambiental por MWh produzido é das mais baixas (só comparável à hídrica) de todas as fontes de energia eléctrica conhecida.
Segundo argumento: o custo elevado. França tem a energia eléctrica mais barata da Europa. A Alemanha com a paragem das centrais nucleares viu o preço da electricidade aumentar. Os países com mais renovável tem as energias mais caras da Europa. Ouço muitos detractores do nuclear usar a segurança como razão mas o preço da electricidade? Éuma ideia ainda mais gasta do que o peak oil.

Terceiro argumento: o tempo de construção. Per si não é um impedimento, requer planeamento estratégico de longo prazo. Em Portugal onde isso não existe pode considerar-se uma desvantagem. O grande inconveniente do prazo de construção alargado de uma central nuclear está nos custos decorrentes de derrapagens na construção. Ainda assim esse inconveniente não detém vários países de apostar fortemente na construção de centrais nucleares.

Quarto argumento: falta de reservas de urânio. Agostinho Miranda afirma que para que a energia nuclear fornecesse toda a energia do planeta seriam precisos 8.000 reactores nucleares ao invés dos actuais 450 (6%) e que para isso não existe combustível necessário. Os números estão correctos mas a argumentação é descabida. Primeiro, provavelmente apenas de carvão existem reservas para se pensar numa planeta com uma única fonte de energia. Depois Agostinho Miranda sabe que é tecnicamente inviável nas próximas décadas substituir o petróleo por electricidade no sector dos transportes. Fazer cenários de 100% de energia de origem nuclear é inútil e só revela parcialidade intelectual.
Mais, se o mundo decidisse apostar de forma tão decidida em centrais nucleares a investigação e desenvolvimento teria um enorme incremento de financiamento. Muito mais rapidamente a 4ª geração de centrais e a utilização de tório como combustível seria industrializado. Com estas inovações que se perspectivam a existência de reservas de combustível nuclear torna-se um problema inexistente. O peak uranium de Agostinho Miranda coloca-se tanto como o peak oil que o próprio afasta.

Logo de seguida cita Churchil para afirmar que o futuro está na diversificação de fontes. Afasta a energia nuclear por esta não ser capaz de fornecer toda a energia que o mundo precisa mas as renováveis fazem sentido num cenário de diversificação de fontes. Objectivamente Agostinho Miranda não consegue eliminar a solução nuclear e fá-lo esgrimindo entraves absurdos, entraves que não coloca a outras fontes de energia.

Defender o nuclear em Portugal é não só esclarecer quem tem preconceitos infundados sobre o assunto mas também contrariar argumentos inconsistentes de pessoas supostamente informadas. É um duplo desafio, uma uphill battle!

2 comentários:

  1. Excelente artigo. Fiz mais ou menos os mesmos comentários na página do Facebook do programa Olhos nos Olhos. Convido-te a publicares lá este texto.

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  2. Já coloquei o link. Obrigado pela dica e pelo comentário sobre o post.

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