terça-feira, 15 de novembro de 2011

RenewableUK tem humor britânico

O comentário de um leitor neste post sobre o shale gas britânico levou-me a pesquisar sobre um relatório elaborado pela consultora KPMG. O relatório intitulado "Thinking about the Affordable" compara dois cenários de mix energético do Reino Unido em 2020, um com forte presença de fontes renováveis e outro com mais peso de nuclear e gás natural. Infelizmente não encontro o relatório pelo que não posso comentar sobre ele. Consegui arranjar um resumo com dois gráficos que ilustram, na visão da KMPG, a grande diferença entre os dois cenários. Na hipótese renovável o gasto em infraestruturas supera em £34B (biliões anglo-saxónicos) a via térmica/nuclear. No primeiro caso é de £108B e no segundo de £74B. O relatório tira três importantes conclusões:
  1. Economic modelling of different electricity generation scenarios, to calculate the cheapest way of meeting the UK’s 2020 emission reduction targets, has shown that achieving self-imposed renewable energy targets as well as EU carbon reduction targets could cost an additional £34 billion of upfront investment;
  2. Planning constraints and ‘not in my back yard’ public opinion of onshore wind is costing the UK more than £10 billion. Subject to any planning reform, this means  more expensive offshore wind developments are needed;
  3. A heavy weighting of renewable energy in the low carbon generation mix costs an additional £55 more per tonne of CO2 saved than the cheapest scenario.
Não encontrei o relatório da KPMG mas encontrei a resposta da associação inglesa de energia eólica, ondas e marés, RenewableUK. O comentário enferma das habituais lacunas da narrativa pró-renovável.

A RenewableUK prevê que sem renováveis "electricity bills will be pushed up by 52% because of the volatility of fossil fuel prices". Os preços do gás natural, à conta do shale, têm descido em certos mercados, caso do americano. Mesmo a nível global não é provável que o preço do gás natural suba muito nas próximas décadas. Se em solo inglês existirem reservas de gás de xisto como a Cuadrilla admitiu o sector eléctrico britânico dependerá muito menos da importação do que até agora.
O estudo da KPMG refere que com renováveis é preciso investir mais £34B o que só pode surpreender mesmo quem vive iludido com estas fontes. Como tenho repetido inúmeras vezes só renováveis + gás natural (para backup) + barragens ou baterias (para armazenar) pode ser comparado a nuclear + gás natural. Não é difícil perceber que numa solução com elevado peso de renováveis seja preciso investir mais em parque electroprodutor, para além da rede, mesmo que parte dele vá ficar parado boa parte do tempo.

Os argumentos da RenewableUK atingem níveis humorísticos como neste por exemplo:
In Germany, Denmark and Spain, three European countries with a high level of wind power deployment, the low operational cost of wind means that it is the first choice of power source used to meet demand, displacing more expensive options, and thereby actually reducing rather than increasing electricity prices.
Na Alemanha, Dinamarca, Espanha (ou Portugal) a energia eólica não é a "primeira escolha" para responder à procura. Nestes países com excesso de eólica a rede está legalmente obrigada a escoar preferencialmente energia renovável. Se não houvesse esta prioridade imposta nenhum destes países a ia adquirir de livre vontade.

E fica ainda melhor:

The report states that wind farms only generate electricity for about one-third of the time. This is factually incorrect. Wind turbines in fact generate electricity for 80-85% of the time. They generate the maximum possible amount at full speed for about one-third of the time. KPMG appear to have confused these two concepts, leading to a basic error which does not inspire confidence in the rest of their research.
Claro, as turbinas funcionam entre 80-85% do tempo e não os 33% ditos pela KPMG (a média mundial andará pelos 25% mas adiante). É perfeitamente irrelevante que durante períodos destes 80% do tempo os aerogeradores sirvam para pouco mais do que manter acesa a iluminação pública, para a RenewableUK as turbinas trabalham tantas horas quanto um reactor nuclear!

Será que a RenewableUK não entende que o factor de capacidade é uma forma expedita de comparar a produtividade entre fontes de electricidade? Será que a RenewableUK não percebe que dizer que a eólica produz durante 1/3 do tempo não é dizer literalmente que as turbinas trabalham ininterruptamente de Janeiro a final de Abril e depois param o resto do ano?

O irrealismo prossegue:
"Those countries who previously embraced wind energy have reaped the rewards in terms of job creation. In Germany 80,000 people are employed in the wind energy sector, in contrast in the UK which missed its opportunities with onshore wind in the 1990s. Our wind industry currently employs just 10,600. RenewableUK's report "Working for a Green Britain" shows how this will could be increased to almost 90,000 people by 2020, but only if the Government recommits to offshore wind and meeting the 2020 renewable energy targets"
Por "recommits" deve entender-se "subvencionar". Com apoios estatais e prioridade no acesso à rede a violar o mais básico princípio da concorrência todos os empregos se podem criar, mesmo o de vendedor de areia no deserto.

Fico em pânico a pensar que são organizações com esta capacidade de pensamento e argumentação que influenciam o futuro do sector eléctrico europeu! Ou será que é deliberado? Coloca-se a ética e a honestidade na gaveta para continuar a viver à custa de subsídios?

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