sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Dois argumentos anti-nuclear dos pró-renováveis

Boeing 787 - um marco em 2011, obsoleto em 2041
Na semana passada estive na conferência na Ordem dos Engenheiros em que se debateu a plausibilidade económica de Portugal ter uma central nuclear. A resposta a esta questão é eminentemente política dado que Portugal não tem nenhuma particularidade geográfica ou técnica que o torne singularmente adverso a ter geração eléctrica nuclear. Se o resto do mundo pode Portugal também.

Os dois oradores foram o Eng. Pedro Sampaio Nunes, especialista na área energética e conhecido defensor da opção nuclear e o Prof. Manuel Collares Pereira da Universidade de Évora que defendeu a via renovável. Discutir nuclear vs "novas renováveis" (eólica, solar, ondas, marés, biomassa, etc) torna-se infrutífero dado que, com a tecnologia actual, as fontes renováveis não têm escala para substituir a produção fóssil ou nuclear. E como defendi aqui, a quarta geração da energia nuclear será, de um ponto de vista prático, renovável.

Ainda assim, gostei do resultado do debate e creio que se deu mais um pequeno passo para a introdução de energia nuclear em Portugal. Durante a sua apresentação o Prof. Collares debitou os típicos lugares-comuns, medos infundados e completa ausência de argumentos técnicos que permitam consubstanciar a impossibilidade de Portugal instalar um reactor nuclear. Não vou rebater tudo o que foi dito até porque os próprios provavelmente não virão aqui defender-se. Mas vou realçar duas ideias proferidas, um por Manuel Collares e o outro pelo Presidente da APREN, António Sá da Costa.

Argumento 1- Manuel Collares - A tecnologia nuclear evolui

Este argumento é pró-nuclear, é bom a tecnologia de reactores evoluir, no entanto foi a base da argumentação anti-nuclear de Manuel Collares. Este mês o voo comercial inaugural do Boeing 787 deu direito a peças nos telejornais em todo o mundo e justificadamente. Não obstante os atrasos no seu lançamento, o 787 marca uma nova geração de aeronaves comerciais. Daqui a 30 anos o 787 estará inevitavelmente desactualizado mas no presente é uma referência de eficiência em transporte intercontinental.

Os reactores Areva EPR ou Westinghouse AP1000 de geração III+ são, em 2011, a última palavra em energia atómica, a forma mais limpa e segura de produzir electricidade de base mas Manuel Collares rejeita-os alegando que dentro de 30 anos estarão obsoletos. Pior, como consomem o raro isótopo U235 cujas reservas darão para mais 30 anos (segundo Collares), um reactor destes nunca poderia funcionar todo o seu tempo de vida útil (60 anos) por falta de combustível. Creio que os ingleses, checos, finlandeses entre outros deviam ser avisados disto.

Collares disse que os reactores de quarta geração serão viáveis pois consomem U238 muito mais abundante e serão bastante mais eficientes. Portugal só pode, por isso, pensar em energia nuclear na segunda metade deste século. Só que daqui a 50 anos a fusão nuclear poderá ser uma hipótese real, nessa altura os reactores Gen IV estarão obsoletos. Portugal deve, nesta óptica, esperar por 2100.

Este tipo de argumento, se aplicado a todas as fontes de energia eléctrica, é mortal para o sector renovável. Se a tecnologia evoluir então não faz sentido Portugal instalar os actuais aerogeradores e painéis solares. Se Collares defende a instalação da actual tecnologia então está a admitir que a tecnologia não vai evoluir. Se a tecnologia não evolui a base para a existência das tarifas feed-in deixa de existir pelo que devem acabar de imediato. Seja qual for a hipótese  é um beco sem saída para as fontes renováveis.

No final de contas, é irrelevante qual vai ser o estado da tecnologia e a competitividade comparativa entre as várias fontes de energia em 2030, é um exercício especulativo com pouca importância prática. Em 2011 a solução nuclear não só é viável como é a mais racional. É isso que deverá importar aos decisores políticos.

Argumento 2 - Sá da Costa - Nuclear precisa de bombagem em barragens

Muitas vozes têm dito que a construção das novas barragens em Portugal só está a acontecer para consumir energia eólica. Este argumento irrefutável irrita os defensores da eólica que afirmam, demagogicamente, que a energia nuclear também precisa de bombagem. Foi o caso de Sá da Costa durante a conferência. Comparar a necessidade de armazenagem de energia nuclear com a eólica ou é desonesto ou mostra uma incapacidade de fazer contas elementares. Mas vamos a elas.

Sá da Costa dá o exemplo de França para justificar a necessidade que o nuclear tem de bombagem. Sá da Costa esquece-se que o nuclear representa 75% do parque electroprodutor francês. Se Portugal atingisse esse tipo de penetração de nuclear precisaria de bombagem mas se existisse um planeamento energético de longo prazo o país podia ir até 50% de contribuição atómica sem precisar de bombagem. As novas barragens reversíveis servem para permitir que a eólica atinja apenas 20% do mix. Isto porque com um FC de 25% é preciso instalar uma potência equivalente a 80% do consumo médio para se atingir 20% de abastecimento. Naturalmente 80% do consumo médio é mais do que o consumo em vazio. Só que nem é a partir de que percentagem precisam de bombagem que se faz toda a diferença entre eólica e nuclear.

Realmente relevante é que se a bombagem consome MWh subvencionados, como é o caso presente da eólica, a bombagem para além de pesar na eficiência energética do país também pesa na carteira dos consumidores. É isso que se passa na associação eólica/barragens. A energia eléctrica produzida em centrais nucleares e turbinada em barragens é competitiva em mercado livre e é por isso que França, apesar de recorrer a ela, consegue ter um custo energético extremamente baixo.

Esta questão do nuclear precisar ou não de bombagem acaba por se tornar irrelevante em Portugal dado que o governo não vai parar o PNBEPH. A capacidade vai estar instalada e mais vale ser usada. EM 2020 Portugal vai ter capacidade de bombagem que permitiria a replicar o mix produtor francês a partir de 2030.

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